O que acontecerá com os hotéis e edifícios de escritórios vazios?
Imóveis comerciais foram atingidos pela pandemia, mas há planos para converter espaços em residências
- Pandemia fez com que hotéis e prédios de escritórios de Nova York ficassem vazios
- Algumas dessas propriedades talvez nunca se recuperem. Mas está em curso um esforço para pegar essas estruturas comerciais vazias e convertê-las em moradias
- De arranha-céus corporativos no distrito financeiro a hotéis boutique perto do Central Park, passando por acomodações de médio porte no centro da cidade, os agentes imobiliários estão reformando ou vasculhando dezenas de locais
E algumas dessas propriedades talvez nunca se recuperem. Está em curso um esforço para pegar essas estruturas comerciais assustadoramente vazias e convertê-las em moradias de algum tipo – e talvez outros usos também – o que pode estimular uma série de conversões de edifícios não vistas desde o colapso do final da década de 1980.
Mas, no mundo dos empreendimentos imobiliários, reformas de cima a baixo podem levar anos e uma recuperação robusta pode fazer os proprietários pensarem duas vezes antes de fazerem grandes reinvenções. Requisitos de espaço e segurança também podem complicar algumas conversões, dizem executivos do setor imobiliário.
Ainda assim, com algumas empresas permitindo que os funcionários trabalhem permanentemente de casa e autoridades se preparando para um turismo que não vai se recuperar totalmente por alguns anos, existe muito apoio para dar vida nova a edifícios em dificuldades.
“A covid acelerou os reaproveitamentos”, disse Nathan Berman, diretor administrativo da Metroloft Management, uma incorporadora que está no processo de compra de dois grandes edifícios de escritórios na parte baixa de Manhattan, os quais foram duramente atingidos pela pandemia.
Esses prédios, que Berman se recusou a nomear agora que as negociações ainda estão em andamento, podem se tornar imóveis de aluguel a preços de mercado. “Eles são alvos perfeitos”, disse ele.
De arranha-céus corporativos no distrito financeiro a hotéis boutique perto do Central Park, passando por acomodações de médio porte no centro da cidade, os agentes imobiliários estão reformando ou vasculhando dezenas de locais, de acordo com os envolvidos.
Até agora, a maior parte das atenções foi direcionada para Manhattan, lar dos maiores distritos de negócios e turismo da cidade e onde a pandemia desferiu os golpes mais duros. Mas também estão de olho nos hotéis no Brooklyn, onde os preços dos edifícios geralmente são mais baixos.
As conversões parecem se enquadrar em três categorias: escritórios em habitação, hotéis em habitação e hotéis em escritórios, embora não para estadias longas, mas para sessões de curta duração.
“Definitivamente, está acontecendo todo tipo de coisa”, disse Eric Anton, agente da empresa Marcus and Millichap especializado na venda de edifícios. Dos sete hotéis de Nova York que ele representa, três provavelmente se tornarão residências para idosos, um se converterá em prédio de apartamentos de preço de mercado e os demais continuarão sendo hotéis.
“Mas muitas das conversas giram em torno de saber se as conversões podem acontecer de forma eficiente”, disse Anton.
Salas de reuniões viram quartos
Alguns edifícios, é claro, podem ser convertidos mais facilmente do que outros.
Décadas atrás, os prédios de escritórios do pré-guerra passaram por uma onda de reinvenção. No distrito financeiro, que ficou vazio depois que seguradoras e bancos de investimento se mudaram para a parte alta da cidade, os incorporadores pegaram o mármore e o granito das antigas sedes e as dividiram em apartamentos.
Mas não sobraram muitos desses grandes edifícios antigos, pelo menos não no centro da cidade, forçando os incorporadores a pensar em estruturas mais novas, como as torres de escritórios vítreas de meados do século 20, que em alguns casos ficaram obsoletas à medida que ofertas mais sofisticadas surgiram ao seu redor.
Em março, mais de 17% dos escritórios de Manhattan estavam vazios ou iriam se desocupar em breve, com uma taxa um pouco mais alta no centro da cidade, de acordo com a imobiliária CBRE. Poucos desses espaços estiveram tão vazios assim desde o início dos anos 1990.
Embora muitos proprietários sejam investidores de longo prazo, que não entram em pânico diante de tempos tumultuados, a atmosfera de cidade fantasma talvez esteja provocando um certo nervosismo. As projeções da cidade sugerem que as torres de escritórios de Manhattan estão valendo 25% menos desde que a pandemia começou, há um ano.
Berman, que por anos converteu propriedades pré-guerra, como 67 Wall St., 84 William St. e 20 Exchange Place, recentemente se tornou um modernista. Os dois prédios de escritórios que ele está negociando agora se ergueram no período do pós-guerra, disse ele, acrescentando que ambos são da variedade “Classe B”, expressão que no setor imobiliário significa “meio monótono”.
“É muito caro modernizar esse tipo de edifício, então uma mudança de uso é realmente o melhor caminho”, disse Berman, acrescentando que eles geralmente não são marcos históricos, o que reduz o número de licenças necessárias.
Mas como estruturas onde as pessoas até então se debruçavam sobre computadores e se amontoavam em salas de reuniões podem se tornar lugares para morar? Será que é fácil?
Depende muito, disse o arquiteto John Cetra, cofundador da empresa CetraRuddy, que já transformou salas de reuniões em quartos em vários endereços de Manhattan.
Um fator importante é a distância entre a fachada e os elevadores, também conhecida como lease span [algo como “vão de aluguel”]. Na hora de criar moradias, quanto menor essa distância, melhor, segundo Cetra.
O ideal é uma extensão de 10 metros, disse Cetra semanas atrás, enquanto conduzia um tour pelo 20 Broad St., um antigo prédio de escritórios de 1957, próximo à Bolsa de Valores de Nova York, que em 2018 trocou seus corretores por moradores. (Mas o cofre do banco, com suas portas grossas, continua no porão e agora serve como lounge).
No 20 Broad, um projeto CetraRuddy, o lease span mede 15 metros, o que está perto do limite externo do que pode funcionar, explicou ele, acrescentando que qualquer coisa maior “simplesmente fica muito estranha”, porque os apartamentos provavelmente precisariam ter grandes espaços sem janelas e outras áreas de difícil adaptação.
Mas os edifícios de escritórios construídos mais recentemente costumam ter lease spans de mais de 15 metros, disse Cetra, sugerindo que pode ser difícil construir apartamentos convencionais nesses espaços.
Sem serviço de quarto
É uma época difícil para os hoteleiros. Enfrentando uma seca de turistas e viajantes a negócios, cerca de 200 dos 700 hotéis da cidade fecharam desde a chegada da covid-19 e muitos desses fechamentos devem ser permanentes, sobretudo com o aumento das dívidas.
Também há muitos empréstimos complicados. Desde o outono, os hotéis na área de Nova York lideram o país em termos de inadimplência, de acordo com a empresa de análise Trepp, que monitora hipotecas securitizadas. Em abril, os hotéis de Nova York responderam por US$ 1,8 bilhão em saldos não pagos, ultrapassando em muito o segundo lugar, Chicago, com cerca de US$ 1 bilhão em atraso.
Embora prossiga na cidade a construção de novos quartos de hotel, ocorreram muitas baixas, grandes e pequenas. O Hilton Times Square, hotel de 476 quartos, fechou no outono passado e, após meses sem pagamentos do proprietário, o Sunstone Hotel Investors neste inverno acabou nas mãos de um credor, com destino incerto.
De maneira similar, o Holiday Inn FiDi, arranha-céu de 50 andares e 492 quartos próximo ao Museu e Memorial Nacional do 11 de Setembro, agora está em execução hipotecária por causa de três empréstimos problemáticos, de acordo com a Trepp. Mas propriedades relativamente pequenas também estão em dificuldades, como o Hotel Giraffe, de 72 quartos, na Park Avenue South, que ficou mais de três meses atrasado nos pagamentos de hipoteca.
Os que ainda estão funcionando muitas vezes não vêm operando como hotéis normais. Um ano atrás, num esforço para impedir a disseminação da covid-19 em abrigos geralmente apertados, mais de 60 hotéis da cidade se transformaram em abrigos para 9.500 moradores de rua, um arranjo que continua vigente em muitos endereços.
Autoridades municipais e estaduais têm pressionado pela conversão de hotéis em moradias populares, mas os desenvolvedores observam que os regulamentos de construção podem dificultar essa operação.
Para começar, os apartamentos devem ter pelo menos 15 metros quadrados, enquanto os quartos de hotel podem ser menores. E os apartamentos exigem cozinhas – embora os inquilinos possam compartilhar as instalações de cozinha em alguns conjuntos habitacionais, disse Mark Ginsberg, diretor da Curtis+Ginsberg Architects, que desenvolve projetos a preços acessíveis.
Adicionar cozinhas e aumentar quartos para atender aos regulamentos também poderia reduzir o número de quartos, uma medida contraproducente, disse Ginsberg. Também poderia inflar os custos, transformando uma reforma padrão de hotel – algo em torno de US $ 3 milhões em mudanças cosméticas – numa reforma de US$ 30 milhões.
O processo parece tão assustador que um investidor interessado em converter um hotel de 60 quartos no Lower East Side está ficando nervoso, disse Ginsberg, que está avaliando o local para o investidor.
Desde a primavera passada, Ginsberg consultou cerca de meia dúzia de outros hotéis para clientes semelhantes. “Com a destruição da indústria do turismo, está na hora de agir”, disse ele.
O orçamento do estado aprovado neste mês aloca US$ 100 milhões para reinventar hotéis e transformá-los em moradias populares. Além disso, US$ 270 milhões do plano federal de resgate americano estão destinados aos desabrigados em Nova York, e esses fundos também podem ajudar a financiar conversões. “Há uma sensação de oportunidades concretas aqui”, disse Kavanaugh.
Fechando o círculo
Numa cidade onde as renovações vivem reviravoltas estranhas – igrejas se transformaram em boates, fábricas em lojas de moda e correios em estações de trem – não é de surpreender que alguns prédios possam voltar ao seu propósito original anos depois.
É o que está acontecendo no 960 Sixth Ave., edifício de mármore de 16 andares na West 35th Street que foi inaugurado como prédio de escritórios, teve uma breve vida como hotel e agora está pronto para receber os trabalhadores novamente em maio.
As escrivaninhas são alugadas por cerca de US$ 500 ao mês, em aluguéis de até 30 dias, disse Richard Beyda, um dos fundadores da Yard, que examinou vários outros alojamentos antes de parar por lá.
“Parecia um hotel, mas aí fizemos nossa estética usual”, disse Beyda sobre seu primeiro trabalho de conversão de hotel para escritório. E se algumas pessoas podem olhar para os prédios de escritórios vazios ao redor e torcer o nariz, Beyda vê um ecossistema que está se adaptando.
Os trabalhadores que não querem mais viver no esquema das 9h às 17h talvez acabem voltando, animando-se com a estratégia de local de trabalho mais flexível de sua empresa. “Pode ser o único lado bom da pandemia”, disse ele.
E pelo menos um proprietário está pensando em fazer um redirecionamento total: demolição.
A Vornado Realty Trust neste mês anunciou planos de demolir o Hotel Pennsylvania, edifício de 1.700 quartos em frente ao Madison Square Garden que foi inaugurado em 1919, mas que está fechado há mais de um ano, e substituí-lo por uma torre de escritórios com camadas de jardins ao ar livre.
O Hotel Pennsylvania “já passou de sua glória e data de validade décadas atrás”, disse Steven Roth, presidente da Vornado, em carta aos acionistas. Mas ele também sugeriu que havia problemas anteriores com o setor hoteleiro da cidade.
“A matemática do hotel se deteriorou significativamente nos últimos cinco anos”, escreveu Roth, “vítima do excesso de oferta, dos custos, dos impostos incessantemente crescentes e de uma planta envelhecida”. / Tradução de Renato Prelorentzou.